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segunda-feira, 7 de março de 2011

Amanhã também é dia

Fui-me esquecendo da verdadeira noção de tempo. Os dias ora me pareciam curtos demais, ora longos demais. As noites ora me pareciam curtas demais, ora me pareciam longas de mais. Um dia era só mais um dia, e uma noite, essa era mais uma noite. Assisti ao avançar do tempo no calendário, senti-me velha, triste e sozinha. Todas as minhas conversas remetiam para o passado que eu sentia longe. E repetia, "nessa altura eu sorria", "eu antes era feliz"... Acordava embrulhada numa neblina de sonhos não concretizados, e olhava-me ao espelho e via o meu rosto como um esboço de algo que podia ter sido mas nunca foi, de algo que poderia até vir a ser, mas não é. Arrastava o meu corpo até à chávena de café mais próximo para acabar com os pesadelos do meu sono e ganhar um pouco mais de vida. Adormecia à janela de olhos postos no horizonte, onde não nasce nem se põe o sol, onde só o vago intersecta o céu. Enquanto nada mudava, a minha cara enchia-se de chuva. Núvens cinzentas nos meus olhos lançando tempestades. Logo depois a paz, o silêncio e a solidão. Feridas por sarar. Um sono sem sonho, mas profundo. Alguém me bateu à porta e eu não abri. Ri-me da vida, como se estivesse embriagada. Como se tivesse vivido demais, exageradamente demais. Ri-me de mim. Do trapo que divagava por entre as paredes da casa em silêncio. Ri-me das sombras vulgares da casa sem movimento. Foi então que me lembrei que talvez não tem graça rir do que ficou por fazer e por dizer. Foi então que dancei em frente ao espelho, que enchi os corredores de música e de vento. Deitei-me. Adormeci num cansaço de ser triste. Embrulhei-me num cobertor de sonhos por cumprir e encostei a cabeça numa almofada de esperança. Descansei. O dia de hoje ficou para trás e amanhã, amanhã também é dia.